Recentemente, eu me vi numa situação extremamente estranha
de amizade com uma moça. Já fiz inúmeras reflexões a respeito de tudo o que
aconteceu e, hoje, percebo é possível que eu tenha vivido um relacionamento
abusivo de amizade entre mulheres. No mínimo, um relacionamento bastante
problemático e obsessivo, especialmente pelo fato da figura se autoentitular
como poliamorista/relacionamentos livres, o que me deixou inúmeros questionamentos na cabeça a
respeito do que era essa amizade e de como ela enxergava, na verdade, esse
lance de RLi (e que fez com que eu tenha cada vez mais resistência a isso), mas falarei sobre isto mais no final deste texto. Agora vou apenas descrever um pouco os fatos.
A figura era contato de uma rede social. Aparentemente, era
minha “fã” (detesto esse título, mas a própria se descrevia desta forma). Em
janeiro de 2016, essa figura se aproximou mais, vendo a necessidade que eu
tinha (e tenho ainda!) de algum suporte com a minha vida tão sobrecarregada de
mãe solo, mulher trabalhadora que perdeu quase que totalidade de sua liberdade
de ir e vir por causa do abandono paterno associado a uma conjuntura econômica
nada favorável. Não havia muita possibilidade de aumentar a fonte de renda em
função das demandas de cuidados das crianças, e isso criou uma bola de neve de
falta de liberdade: sem ter como sair para ganhar mais e pagar alguém que
pudesse olhar as crianças, sem poder sair para respirar por não ter com quem
deixar as crianças nunca.
Então, essa figura salvadora da pátria aparece, do nada, por
inbox, se oferecendo de todas as maneiras possíveis para cuidar dessas crianças.
Obviamente, a mãe desesperada porque precisa trabalhar e não pode mais contar
com o período integral da escola que ela não consegue pagar, aceita essa
aproximação, e acha muito linda a demonstração de sororidade vinda de uma
pessoa que não tinha sequer filhos. UAU! Que linda ela! Que moça incrível, nem
me conhece e já quer me ajudar assim, de maneira tão prática, tão “mão na massa”!
Caramba, não é que a tal da sororidade parece que existe mesmo?!?!
Então, nos aproximamos. Com pouco tempo de aproximação, eu
já a considerava muito amiga, desprendida, massa, tudo de bom essa menina,
poxa! Daí um detalhe importante: eu estava em um estado emocional extremamente
crítico, tinha acabado de terminar um ~relacionamento~ (cof cof) mal-resolvido
com um cara que amava/amo muito e, aliado à crise de depressão, encontrava-me
numa situação de desespero para encontrar qualquer pessoa que pudesse preencher
aquele vazio e aquela dor. Então essa moça – que é bissexual como eu – soltou um
inocente “Ei, Paty, você não quer ser minha crush não?”. Aquilo, não sei bem
porque, me encantou. Aquela menina linda, disposta a me ajudar e super legal
estava interessada em mim, justo num período que minha autoestima estava um
lixo. UAU! Que massa! Chegamos a ficar uma vez, foi legal, mas depois fui
acometida por um sentimento de culpa enorme, de que estava errado em tentar
substituir um afeto por outro assim, de forma compulsória, forçada e
desesperada. Entendi que precisava dar um tempo pro meu coração se acalmar de
tanta angústia e desespero. E fui bem clara com ela, expliquei que ainda estava
muito ligada ao boy com quem eu tinha terminado e que não era justo fazer isso
com ela.
De boa. Amigas apenas, então. Né? É.
Cerca de dois meses depois, após aproximações mil e contatos
diários, ela fala que precisa conversar pessoalmente comigo. Vai lá em casa num
domingo para perguntar se “há problemas de transar com o cara” com quem eu
tinha esse lance e com quem eu tinha terminado (e nessa altura, já tinha
reatado o romance eterno e sem fim com ele). Gelei, né? Insegura, depressiva,
em crise de ansiedade aguda e em crise depressiva desde 2014, aquilo acabou
comigo, com minha autoestima. Eu
respondi que sim, que havia problemas SIM, que finalmente eu assumi para mim
mesma que eu sou uma pessoa ciumenta (em função das próprias circunstâncias
emocionais). Ela apenas me pergunta “você é monogâmica”? Me senti culpada por
admitir que sim, sou. Depois eu entendi que não há nenhum problema nisso, faz
parte do meu eu emocional ser insegura, e essa insegurança traz ciúme por medo
da perda, é diferente de ciúme por posse. Nada de errado com isso, estamos
trabalhando essa insegurança na terapia, eu não tinha que sentir culpa por
sentir isso. Mas senti. Começaram os problemas.
Tentei relevar e dizer que, como eu gosto de,
esporadicamente, uma brincadeira mais caliente no sexo, não teria problemas se
eu participasse junto. É, um ménage. Foi essa a minha proposta. Meio louca, né?
Não, não é. Não para mim. Enfim, acabou rolando. Mas depois bateu uma nóia
enorme em mim, de querer saber detalhes como ele a procurou. Depois de muita
treta, envio de prints selecionados por ela do que ela queria que eu visse, ela
(por iniciativa própria) me deu a senha da rede social e eu fui lá ver todo o
bate-papo deles. Foi quando eu percebi que: ela tomou a iniciativa do primeiro
contato, alegando ser assunto profissional. Ela respondeu positivamente à
brincadeira mais quente e trocaram nudes antes de me falar (eu soube por ele,
logo no dia seguinte à conversa, mas ela me escondeu isso até me dar a senha e
eu a pressioná-la). Ela disse a ele que EU havia dito que não haveria problemas
deles dois transarem ~depois~, contanto que rolasse com os três antes, e eu
NUNCA falei isso. Pelo contrário, sempre deixei claro que se rolasse os dois,
EU NÃO QUERIA SABER, mas que eu preferia MESMO que não rolasse, mas que essa
escolha não era minha. Depois, ela disse que não entendeu assim. Arram. Depois
de criado por mim um grupo virtual composto pelos três elementos numa rede
social, que foi criado com o intuito da brincadeira a três ser SÓ a três, ela
puxa conversa com ele em privado perguntando se vão ficar falando só pelo
grupo. Oi?!? Haja pulga começando a se instalar atrás da minha orelha.
Terminei de novo com ele, continuei amiga dela. Essa
terminada com ele foi a mais definitiva, havia cortado todos os contatos. Mas,
vira e mexe, ela falava dele, cutucando a ferida aberta. Pior: sabendo que era
uma ferida muito aberta ainda e que eu sofria muito com a ausência dele em
minha vida e na das crianças. Então, viajei para palestrar em um evento de bike
em outro estado com minhas crias. Minha surpresa: a moça me avisa que comprou
passagem pra me ver palestrando. UAU! Mas, pera... Tá demais, num tá não? Fala
comigo absolutamente TODOS os dias pelo WhatsApp, se oferece QUASE TODOS os
dias para me ajudar com as crianças, cai em cima nesse lance de estar presente
o tempo todo demais, mas cobra minha presença no mesmo nível (mesmo sabendo que
minhas atribuições maternas não me permitem tanta disponibilidade)... Comecei a
estranhar, mas, enfim.
Depois desse evento, ela arrumou uma bicicleta, mas não
antes sem criar mais uma treta: de que o boy (é, aquele mesmo, da ferida
aberta) se ofereceu pra dar uma força pra ela pedalar lá na ocasião da viagem
em que eu palestrei e ela foi, já que havia se submetido a uma cirurgia
cerebral que comprometeu sua coordenação motora, e eu a estimulei dizendo que o
ato de pedalar iria ajudar bastante. Mas ela chega, sabendo que eu estou numa
super bad por causa da depressão, milhões de problemas pessoas e de saúde, e
pergunta se haveria problemas que ele a ensinasse. Como sempre: TEM PROBLEMA
SIM. Falei com todas as letras. Eu queria esquecer o fantasma que ela fazia
ressurgir das cinzas o tempo todo. Falou, depois, no meio da treta, que me deu
a senha acreditando que eu não iria acessar (oi?). E haja treta. E ela só
relembrando e cutucando fatos que desencadeavam crises loucas de ansiedade.
Aí, o estopim: a pessoa, em janeiro de 2017, me manda uma mensagem
dizendo que está se sentindo “usada”, que ela só servia quando eu queria algum
suporte com as crianças (que peso, hein?), que estava achando a relação
desigual, e pediu que eu LISTASSE todas as coisas boas que eu já fiz para ela. Gente.
Como é isso? Sororidade é moeda de troca? A figura SEMPRE soube, a vida
inteira, que eu não tinha tanta disponibilidade de me doar quanto eu desejava,
justamente por conta das minhas próprias atribuições de vida e com minhas
crianças, sabem? Não é mole eu ser a única pessoa responsável por três vidas
(no caso, eu e minhas crianças). Eu sempre deixei isso bem claro a todo mundo
que se oferece para me ajudar, mas eu sempre deixei mais claro ainda que eu
NUNCA QUIS que as pessoas sofressem ou sacrificassem a própria vida para me
ajudar, que eu entendo que cada uma tem suas próprias demandas.
Foda isso. Mais do que ela ter perguntado se tinha problemas
em transar com o boy, mais do que as inúmeras tretas virtuais em que ela me
envolveu – porque sim, teve mais treta envolvendo terceiras pessoas, visto que cheguei
a receber uma mensagem de uma ex-amiga dela perguntando porque eu era essa
pessoa tão “ruim” assim, que “fica inventando coisas” de pessoas que eu nem
conheço (!!!), inclusive essa mesma moça ex-amiga tem a mesma queixa de que ela
perguntou se haveria problemas em transar com o boy que ela amava. Igual como
rolou comigo.
Velho. Caiu a ficha então. Uma coisa obsessiva. Descobri, já
com todas as pulgas do mundo atrás da minha orelha, que ela stalkeava TODAS as
minhas redes sociais diariamente, além de perguntar todos os dias “como você
está hoje?” de forma compulsiva e diária pelo WhatsApp. E, confesso, isso me
incomodava, porque dava sempre a impressão de que eu era vista como doente ppor
ela em 100% do tempo. Sabia de todos os meus passos. Azarou o boy que eu amava (ou deu cabimento à azaração dele). Decidiu
começar a pedalar (até aí, massa, adoro ser esta influência), mas queria uma
bike de carga igual à minha para “viajar”, mesmo eu dizendo que a cargueira não
era a melhor opção para cicloviagem. Cobrava presença. Não me deixava respirar.
Uma coisa patológica, mas cuja figura, pelo jeito, nunca vai admitir que
precisa sim de ajuda especializada, pelo jeito.
Espero estar errada, mas no meu entendimento, a figura
parecia que queria ser eu, roubar meu lugar no mundo. Uma amizade bastante
problemática. E, definitivamente, já tenho problemas emocionais demais para ter
que viver um relacionamento de amizade nesse nível de paranóia. Não tive
dúvidas: cortei relações. Bloqueei de tudo.
Outro aspecto que me veio à tona após eu me afastar e após muitas reflexões sobre quem ou o que era ela foi a de que existem pessoas que se autodenominam como fazendo parte de um grupo que acredita em "relacionamentos livres", porém, não percebem que isso acabou sendo direcionado APENAS para relacionamentos amorosos/sexuais em si, ou seja, não querem muita profundidade e cobranças em relacionamentos amorosos, mas descarregam todas as suas carências e fendas emocionais em relacionamentos de amizade. Ou seja, cobram, sufocam, fazem violência psicológica, mexem com a autoestima e oprimem pessoas com quem têm relacionamentos mais estreitos de amizade. Esquisito, né? Eu acho.
E tenho medo sim. Já vivi um relacionamento (que não era de
amizade, mas amoroso, só que também obsessivo) com uma pessoa doente e que não
se enxergava como doente e boa parte dos problemas emocionais e traumas que eu
carrego hoje foram oriundos dessa relação. Não preciso, não posso, não quero.
2017 chegou e trouxe com ele uma grande determinação para
minha vida: a de correr longe de tudo e todos/as que podem me fazer mal. Desta
forma, corri dessa amizade sim. Recentemente ela deixou um pote cheio de paçoca
na minha portaria com uma carta que, mais uma vez, me fez sentir culpada: mais
uma vez muitos julgamentos a respeito da minha “falta de preocupação com ela”
usando como comparativo a dedicação dela a mim, mas finaliza falando que gosta
muito de mim e sente saudades.
Tremi toda. Sim. Mais uma crise de ansiedade
cujo gatilho foi uma pessoa que esteve envolvida como agente causadora ou como
suporte de muitas outras que tive no nefasto ano de 2016.
Não. Esse tipo de amizade não é para mim. Agradeço tudo de
bom que ela fez por mim, mas o mal que ela me fez, as crises engatilhadas por
ela, não estão no gibi. E de drogas eu estou fora, além do meu chá de casca de
mulungu para depressão, não quero esse tipo de falsa ajuda na minha vida.
Obrigada de nada.
EDIT: tive medo de divulgar esse texto. Por simples e puro medo de que ela veja. Uma relação que traz medo, crise de ansiedade, choro, angústia e sensação de sufocamento, definitivamente, não é uma relação saudável. Portanto, não permiti comentários aqui. Única e simplesmente por medo dela comentar. Percebem como a coisa fugiu do meu controle? Como mexeu patologicamente com um emocional que está ainda sendo reconstruído? Foda.
Mas sim, eu precisava desabafar.